2010-05-28

Ordem natural das coisas

Heim? Nesta semana ouvi outra conversa interessante de banheiro… Um sujeito disse:

— O melhor é mais caro.

O outro responde:

— É a ordem natural das coisas.

Então eu me perguntei: é a ordem natural das coisas?

Na Natureza, melhor e mais caro não têm relação. Se um concorrente de um nicho é mais eficiente (melhor) que outro, sobrevive ao outro. Se um concorrente demanda menos esforço (é mais barato) que outro, sobrevive ao outro.

E um concorrente pode ser mais eficiente e demandar menos esforço que outro – claro, sobreviverá ao outro.

Se o Mercado fosse orgânico, o preço de produtos e serviços seria relativo a seu custo (sempre acrescido do lucro) de produção e/ou manutenção, independente de ser melhor ou pior. Assim, se for ainda melhor que os concorrentes, tende a superá-los e sobreviver a eles.

Veja que isso não tem nada a ver com monopólio, oligopólio, cartel, lobby ou subsídio, mas com sobrevivência dos mais aptos.

No entanto no Capitalismo não é assim: se um produto é melhor, o fabricante tende a aumentar seu preço e superfaturar. Isso prejudica o consumidor, que se vê obrigado a escolher entre produtos/serviços ruins e outros desnecessariamente caros.

O Capitalismo e o Mercado não seguem a ordem natural das coisas, mas a lei do lucro voraz, do abuso e do desrespeito.

Por isso os neoliberais são contra a participação do Estado no Mercado. Se o Mercado se autorregular, será a favor do apetite insaciável e inescrupuloso dos fabricantes, não a favor do consumidor ou da sobrevivência do mais apto.

Agora, se o Estado interfere no Mercado através da concorrência salutar e regulatória, as empresas são obrigadas a praticar preços justos, o que, além de baratear produtos e serviços, aumenta em muito sua qualidade, já que os inaptos não sobrevivem.

Isso está prestes a acontecer no mercado de telecomunicações! A Telebrás lançará – a princípio nas regiões Norte e Nordeste – banda larga a preço justo – não o mais barato possível, apenas justo –, o que significa 30% do valor praticado pelas empresas de telecomunicações atualmente.

[update 2010-06-08]
Vejam que eu não disse «30% menor que o valor», mas «30% do valor»!!!
[/update]


Que os empresários sem escrúpulos se cuidem, pois, se tudo correr bem, o povo terá cada vez mais sua vez!

[]’s
Cacilhας, La Batalema

2010-05-27

Silêncio, solidão

Paulo Nogueira Batista Jr. Paulo Nogueira Batista Jr. é diretor do FMI representando o Brasil e mais nove países, e era colunista da Folha.

Era… Segundo divulgado pelo Deputado Brizola Neto, a Folha se cansou do professor progressista e cassou-lhe a coluna.

O deputado fez então apelo aos blogueiros a oferecer espaço ao professor para divulgar suas ideias e ideais e faço aqui coro com ele reproduzindo o último artigo do Professor Paulo:

Silêncio, solidão

Paulo Nogueira Batista


HOJE, ESTOU com ímpetos, leitor, de escrever um artigo altamente patético. Veja só o título que escolhi.

Na semana passada, lá estava eu, na trincheira como sempre, na minha vida espartana em Washington, lutando contra as forças do status quo no FMI. Refiro-me sobretudo aos europeus -não todos, há exceções honrosas, mas à grande maioria.

Se permitirmos, essa maioria europeia não só bloqueará as reformas do FMI e de outras instituições como ainda patrocinará reformas regressivas, verdadeiras contrarreformas.

É uma guerra de posições, como a do front ocidental na Primeira Guerra Mundial. Os Exércitos sangravam horrores para avançar alguns quilômetros. O mais belo livro a esse respeito foi escrito por um oficial alemão, Ernst Jünger, e carrega o título forte «Tempestades de Aço».

Mas estou me perdendo do assunto. Aconteceu o seguinte: lá estava eu, na minha trincheira, sob bombardeio, quando veio o que se poderia descrever, com algum exagero (reconheço), como um «Dolchstoss im Rücken», uma «punhalada nas costas» (já que falei em Primeira Guerra).

Telefona-me Raul Juste Lores, que não tive o prazer de conhecer, mas que vem a ser o novo editor do caderno Dinheiro, para informar, de chofre, que a minha coluna deixará de ser publicada pela Folha. Nada de «o gato subiu no telhado» etc. Foi uma execução sumária. Parece que vem aí uma nova turma de colunistas, feroz, antenadíssima com as novas tendências, pronta para escrever sobre temas de vanguarda como tecnologia, linguagem digital, entre outros.

Este é o meu último artigo na coluna. Ora, na minha coluna, os personagens não têm os nomes que têm por mera coincidência ou acaso. Se o novo editor do Dinheiro se chama Juste, isso indica certamente uma inapelável tendência ao equilíbrio e à justiça. Ele me disse com todas as letras (sem intenção de ferir): «A sua coluna é das mais longevas».

Longeva! Senti-me imediatamente como uma múmia, pronta a ser encaminhada para o sarcófago mais próximo.

Fico agora reduzido ao silêncio nestas páginas. (Naturalmente, haverá quem considere que o silêncio veio tarde.) O meu isolamento, agravado pela residência no exterior, aumenta ainda mais. E, claro, as saudades do Brasil -a coluna era um meio de me manter em contato semanal com o país e o leitor brasileiro.

Agradeço à Folha pela liberdade que me deu para expressar meus pontos de vista durante cerca de 15 anos de colaboração regular. Também ao Jacques Constantino, ao Marcos Cézari e a outros que tanto me ajudaram a editar e corrigir os artigos, com grande paciência para as minhas revisões de última hora e para os artigos concluídos, às vezes, no apagar das luzes.

Não me esqueço, em especial, de um episódio. Nos anos 90, o Banco Central entrou com uma notificação judicial contra mim, alegando difamação e ofensas. Foi na época em que a instituição era presidida por certo Napoleão de hospício. A Folha colocou à minha disposição, sem que eu tivesse que gastar um tostão, um advogado especializado que me defendeu com muita competência. O Banco Central acabou desistindo do processo.

Por último, mas não menos importante, agradeço a atenção dos leitores que tantas vezes se manifestaram para apoiar, comentar ou discordar dos artigos. Aos que quiserem, posso informar, via e-mail, onde continuarei publicando artigos daqui para a frente.


[]’s
Cacilhας, La Batalema

2010-05-22

Mitos nacionais

Santos Dumont Vez por outra venho aqui reclamar da porcaria da Super(des)interessante. A edição deste mês traz dezenove (19) supostos mitos sobre a história do Brasil.

Lendo a matéria, a intensão parece ser boa, mas parte de um princípio no mínimo babaca: chocar em vez de informar.

Em meio a mitos de fato, há verdades tratadas como mitos e interpretações pessoais para desconstruir o valor histórico da nação brasileira. Vou citar apenas um falso mito, o mito 9.

O inventor brasileiro (Santos Dumont) foi um gênio. Mas os irmãos Wright voaram 3 anos antes dele e, em 1906, quando o 14 Bis decolou, já tinham um avião bem melhor. A grande aeronave do brasileiro é outra: o Demoiselle, de 1908, primeiro ultraleve da história.


O objetivo de tratar os irmãos Wright como pais da aviação é, além de bajular os estadunidenses, criar revolta para atrair atenção.

Problema número um: Santos Dumont ser brasileiro é um detalhe sem importância, já que sua vida aconteceu na França. Quem deve se orgulhar dele são os franceses.

Problema número dois: a patente dos irmãos Wright foi dada retroativamente pelo departamento de patentes para que os E.U.A. não ficassem atrás da França. Se eles voaram antes de Santos Dumont não é realmente sabido.

O FATO mais importante: é totalmente irrelevante quem voou primeiro! A tecnologia de aviões usada atualmente é a que foi a desenvolvida por Santos Dumont para o Demoiselle, fazendo dele o verdadeiro pai da aviação, queiram os americanos ou não. É importante ainda citar que a Argentina teve um posterior papel importantíssimo para a aviação mundial.

Santos Dumont liberou publicamente o acesso a sua tecnologia enquanto os irmãos Wright, querendo apenas lucrar, vendiam licenças de uso. Havendo uma tecnologia livre equivalmente, sua tecnologia foi arquivada e esquecida, o que prova a superioridade do princípio open source sobre a falácia do modelo proprietário.

A Super(des)interessante ainda erra dizendo:
Aqui ele (Santos Dumont) é o pai da aviação. E ponto final. No resto do mundo, engenheiros e historiadores consideram os irmãos americanos Orville e Wilbur Wrighte mais importantes para o pioneirismo das máquinas voadoras.


Então a Super precisa contar isso para os londrinos! =P


Segundo informações da National Geographic Society e da BBC de Londres, Santos Dumont é o pai da aviação, enquanto os irmãos Wright são não muito mais do que uma nota de rodapé, concorrentes que quase ameaçaram tomar o lugar de Dumont.

Apenas os estadunidenses e seus bajuladores consideram os irmãos Wright, não o resto do mundo.

[]’s
Cacilhας, La Batalema


PS: Impossível não reproduzir certa afirmação da página 78:
…a inexistência de provas não é uma prova de inexistência. A única coisa que a ciência pode fazer é afastar Deus de nosso dia-a-dia, explicando o Universo e as coisas de forma lógica e racional (…). Mas daí a dizer que Deus não existe, vai uma enorme distância. E, se Richard Dawkins não gostar, sempre pode tirar as calças e pisar em cima.